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"Bahn": três trechos da malha poética de Stephanie Fernandes

Foto do escritor: alba.lateinamerika lesenalba.lateinamerika lesen

Atualizado: 2 de nov. de 2024

Em setembro de 2023, Stephanie Fernandes desenhou toda a malha metroviária de Berlim a lápis de cor em folhas de papel vegetal, e escreveu um verso para cada direção de cada linha. Por exemplo, a linha U2, de Pankow a Ruhleben equivale a um verso, ao passo que o trajeto contrário, de Ruhleben a Pankow, equivale a outro verso. O poema, no entanto, não se constrói a partir desses versos iniciais na íntegra. Stephanie vem anotando seu itinerário desde então, há mais de um ano, e registrando o poema que sai de sua locomoção. Se, em uma terça-feira, Stephanie se move da estação Schönhauser Allee até a estação Nollendorfplatz da linha U2, é somente esse recorte do verso que entra no poema. Quando ela faz baldeação ou termina um trajeto, quebra a linha. Cada estrofe, por sua vez, é o registro de um dia.


trecho 01

12 de setembro de 2023 – 16 de setembro de 2023


perpendiculares não se fazem

uma

cidade

enquanto por que não

 

quem se lança aos quatro ventos sem saber quais ou se

torre sineiro e eclesiástico sem se saber dono do tempo

qual seria a graça das acácias a graça dos acasos a graça

descalça e pisa gelado nos clássicos caquinhos no quintal da

 

quem se lança aos quatro ventos

clássicos caquinhos do quintal da

 

porque tem olhos um animal de carga na paisagem também




trecho 02

11 de outubro de 2023 – 18 de outubro de 2023


porque tem olhos um animal de carga na paisagem

que não dizem respeito à domesticação dos felinos mas dos homens


outra

 

perpendiculares como quem se lança

carga tem antolhos porque tem olhos um

 

avó cuja silhueta ainda contorna de cor por fora do vidro canelado da janela


cardeais norte sul leste oeste e tudo que couber entre as perpendiculares como quem

 

e quanto e quem aonde

enquanto por que não

 

além ao tal e quanto e quem

enquanto por que não enquanto e

 

avó cuja silhueta ainda contorna de cor

ou por mal pode ser

ao pé


outra





trecho 03

02 de março de 2024 – 23 de março de 2024


um carteiro inteiro

e talvez enquanto por que não

 

subiu ao alto da torre sineiro e eclesiástico sem se saber dono do tempo

que não dizem respeito à domesticação dos felinos mas dos homens

ao pé do ouvido

qual quando

 

e quanto e quem aonde qual

e talvez enquanto por que não

 

e quanto e quem aonde

quando e talvez enquanto por que não

 

e talvez qual

ouras no litoral são outras capital também é

 

mais ou menos ritmado mais ou

 

fazemos que retornamos ao passo que

 

e quanto e quem aonde

ouvido ao pé do seu ouvido dos seus pés aos seus

no litoral são outras capital também é

enquanto por que não enquanto

 

e quanto e quem

aonde qual

e talvez enquanto por que não




_____________________________________________



Stephanie Fernandes é poeta e tradutora, brasileira, radicada em Berlim. Formada em Linguística pela Universidade de São Paulo, Stephanie observa paisagens enquanto linguagem, pensando sempre em como os movimentos – ventos, estradas, meras caminhadas – compõem a história dos lugares. Traduziu obras de Mary Beard, Virginia Woolf, Christina Rossetti e Emily Brontë para o português brasileiro, e recentemente preparou a primeira edição brasileira de Stanzas in Meditation, de Gertrude Stein, traduzida pela poeta Júlia Manacorda.

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